sábado, 7 de setembro de 2013

Dica de livro | Para Entender O Capital de Marx

 
 
Dos contemporâneos, David Harvey é um dos exímios pensadores do marxismo. Tanto que desenvolveu uma obra que retrata O Capital, Livro I, de Karl Marx. Trata-se do livro "Para Entender O Capital de Marx", que serve de referência para explicar os capítulos da obra de Marx, principalmente o primeiro, que é considerado o mais difícil de entender. O próprio autor concorda.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Espetáculo transporta o público até o início do século 20

Com uma xícara de café oferecida por uma imigrante espanhola, os espectadores são transportados ao início do século 20, tornando-se operário do Grupo Votorantim. Gelsomino Veneto, um dos personagens do espetáculo, é encarregado de chamar os espectadores - um a um – para fazer parte da fábrica. Na sede do grupo, Veneto interroga, de forma intimidadora, o futuro operário da empresa. Ao passar pelos questionamentos, uma das atrizes o direciona a um dos assentos do Espaço Cê.

Todos acomodados, Veneto passa o vídeo “Sociedade Anonyma Fábrica Votorantim, de Arnaldo Pamplona, com cenas de 1922” e, em seguida, uma das personagens explica a estrutura do vilarejo operário, sobretudo como funciona o bairro da Chave. Feitas as primeiras considerações, as luzes do espaço são apagadas, simulando a hora de dormir. Minutos depois, a porta da sede do coletivo é aberta e, por ela, vem um clarão, aparentando ser o amanhecer. “Acordem. Está na hora de trabalhar”, dizia o personagem.

Enquanto o espetáculo estava sendo realizado, crianças e adultos se divertiam batendo uma bola no campo do Grêmio Desportivo Cachoeira. Voltando às cenas. Fomos levados à inauguração da linha férrea, que seria a locomoção dos operários. A seguir, uma das atrizes nos leva para conhecer o trajeto da linha férrea. Foi uma caminhada até chegar a uma escada, que dá acesso a uma das ruas do bairro da Chave, uma das mais antigas de Votorantim. Lá, conhecemos a rotina das mães para cuidar dos seus filhos, enquanto os pais iam trabalhar para ganhar o sustento da casa.

Também encontramos um casal, que acabara de chegar à comunidade, para começar uma vida em família - como era de costume na época. Mas antes de entrar na residência, pessoas foram expulsas dando lugar ao casal. Tais pessoas estavam por dentro de uma organização anarquista que, por sinal, na região, era uma das maiores organizações do País.

Nessa cena, destaca-se algo que veio a agregar ao Coletivo Cê: os musicais. Deu mais “corpo e alma” às cenas do espetáculo. Ficaram ainda mais atraentes. Antes de prosseguir para o próximo ato, o homem, que havia chegado com a mulher no vilarejo operário, vem até a direção dos espectadores e grita: “Nasceu, minha filha nasceu. Ela se chamará Anarquia”. Andando pelas ruas da Chave, é vista como era a forma de trabalho na época. Era normal crianças trabalharem juntos com os pais, sem limite de jornada de trabalho. Inclusive, na cena, a Anarquia, que tinha 5 anos de idade, já trabalhava no Grupo Votorantim como operária. Fazia o mesmo serviço de um adulto.

Greve. Depois de ficar esgotado com tantas horas de trabalho e sem descanso, é organizada a primeira greve entre trabalhadores, a fim de amenizar a situação. A organização era feita em residências dos próprios trabalhadores. Nessa hora, uma pessoa estava infiltrada na moradia para ouvir o que os trabalhadores estavam falando sobre a fábrica. Logo foi expulsa.

A seguir, outro musical marca a cena da peça. O ator Hércules Soares, de burguês, conversa com o proletariado dizendo ser amigo dele e comenta estar preocupado com a situação dos colaboradores da empresa. Em outra passagem do espetáculo, denominada como “Povo às ruas”, retrata o processo de emancipação. No improviso, os músicos mexiam com o público para cantar uma canção em alusão à emancipação. O sim vence e todos vão às ruas comemorar, pois Votorantim é agora, de fato, um município e não está mais ligado a Sorocaba.

Enchente na Chave. Na história do bairro houve duas enchentes: uma em 1929, outra em 1982, que é contada no espetáculo, o que levou vidas e memórias dos moradores. . Na passagem a seguir, os atores contam a saída da fábrica Votorantim do bairro e retratam sobre as mudanças que a comunidade teve. Com isso, os residentes começaram a ter pobreza, conflito familiar e medo de mudança – de sair de um local que eles próprios construíram.

A Era pós-moderna. Com a chegada do século 21, os atores encenam algo que foi desenvolvido na metrópole e que veio até as cidades do interior: a tecnologia. Enquanto a personagem rebolava ao som do Funk Carioca durante um churrasco na laje, ela tirava fotos para depois postar na Internet. Mesmo agregando valores da capital, os moradores não deixam a “cultura local” desmanchar no ar. Isto é visto nas casas geminadas, que até hoje permanece no bairro da Chave.

Depois de percorrer praticamente por todo o bairro da Chave, voltamos à sede do coletivo para ver o lançamento de uma obra, que descreve a história de Votorantim e da Chave, feita pela Anarquia. Lembra-se dela? Ela cresceu e fez um livro. Um dos personagens vem até a direção de Anarquia e discorre: “Não há como explicar a história da cidade e, principalmente, do bairro da Chave, em cem ou mil páginas”. “Eu consegui resumir em 100 páginas a nossa história”, responde Anarquia.

Por fim, o espetáculo se encerra na Cachoeira da Chave, em que um homem tenta abusar sexualmente de uma mulher. Mesmo avançando um século, alguns episódios que aconteciam no início do século 20 ainda acontecem atualmente. Na medida que o homem tentava tirar a roupa, a moça segurava um espelho, simulando o reflexo que acontece na sociedade.

O espetáculo é dedicado à memória de Mariana Alves, que fazia parte do Coletivo Cê. Ela foi vítima de um acidente de trânsito no ano retrasado.

Espetáculo Desmedida, do Coletivo Cê

As apresentações fazem parte do Projeto “Botu-ra-ti: resgatando a memória e a cultura do povo Votorantinense”, realizado com o apoio do Governo do Estado de São Paulo, Secretaria de Estado da Cultura - Programa de Ação Cultural - 2012.
De 7 de setembro a 20 de outubro, aos sábados e domingos, às 17h
De 26 de outubro a 1 de dezembro, aos sábados e domingos, às 18h - por conta do horário de verão
Agendamento com Gelsomino Veneto (www.facebook.com/gelsomino.veneto)
Mais informações: www.coletivoce.com.
Entrada: Pague quanto puder
Em caso de chuva, não haverá apresentação

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Apesar do avanço do IDHM, Votorantim cai 10 posições no Estado

O Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) registrou a queda em 10 posições de Votorantim nos últimos 10 anos no Estado de São Paulo e agora a cidade ocupa a 130ª colocação. Em nível de Brasil, o município também caiu e atualmente está na 268ª, caindo 61 posições no ranking nacional, de acordo com o Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil 2013, divulgado na última segunda-feira (29), pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
 
De acordo com o prefeito Erinaldo Alves da Silva (PSDB), o município cresceu satisfatoriamente em alguns índices, mas em outros indicadores não desenvolveu tanto, se comparado com outros municípios à frente de Votorantim e que fazem parte da região, como é o caso de Itu, São Roque, Salto, Boituva e Sorocaba. Entretanto, a cidade ficou à frente de municípios como Alumínio, Itapetininga, Ibiúna, Salto de Pirapora, Piedade e Capela do Alto.
 
Os pesquisadores se basearam nos dados dos três últimos Censos do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), que foi em 1991 (1°), 2000 (2°) e 2010 (3°). Estudaram 180 indicadores para avaliar as condições de vida da população. Votorantim está na mesma marca que a média dos municípios brasileiros em relação ao IDHM, que foi uma melhora de quase 50% em 20 anos. O município - para ser exato - registrou um desenvolvimento de 45,54% entre 1991 e 2010.
 
Erinaldo explica que cada prefeito buscou melhorar, durante sua gestão, uma determinada área que estava necessitando de reparos. Com isso, a vida do cidadão reflete de acordo com a maneira que o Executivo exerce seu trabalho em prol da comunidade. No período da pesquisa, Votorantim contou com cinco prefeitos: José de oliveira Souza, o Zeca Padeiro (PTB) - 1989 a 1992; Erinaldo Alves da Silva (PSDB) – 1993 a 1996; João Souto Neto (PSDB) – 1997 a 2000; Jair Cassola (PDT) – 2001 - 2008; e Carlos Augusto Pivetta (PT) – 2009 a 2012.

Educação
 
A educação também avançou, mas ficou bem longe do ideal e foi o indicador que ficou entre médio e alto - dependendo do índice analisado. Atualmente, o município conta com cerca de 9.500 alunos matriculados nas Escolas de Educação Infantil e Ensino Fundamental da rede municipal.
 
Em 2010, Votorantim apontou 97,39% “da população de 5 a 6 anos de idade frequentando a escola”. Em 2000, este índice era de 84,25%. Em 1991, o indicativo desce ainda mais: 48,53%. Nos últimos 10 anos, houve um crescimento de 15,60% e, em 20 anos, 100,68%.
Em relação ao “percentual de crianças de 11 a 13 anos de idade frequentando os anos finais do ensino fundamental ou que já concluiu esta etapa”, 55,42% da população tinha esse perfil, em 1991. No segundo indicativo, que é em 2010, o número saltou para 81,77%. O índice mais recente computou um avanço de 92,68%. Ao compará-los, houve um desenvolvimento nos últimos 10 anos de 47,54%. Já nos últimos 20 anos, crescimento de 67,23%.

O terceiro índice do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento é o “percentual da população de 15 e 17 anos com fundamental completo”. Em 1991, O município tinha 26,60% da população dentro enquadrada nesse campo de pesquisa. Em 2000, o número aumentou e atingiu 64,05%. E há dois anos, 76,02%. Entre 1991 e 2000, houve um acréscimo de 140,79%. No caso dos últimos 20 anos, Votorantim cresceu 185,79%.

Já o “percentual da população de 18 a 20 anos de idade com o ensino médio completo” há 20 anos, era de 12,44%. 10 anos mais tarde, o indicador aumentou e parou no patamar de 43,44%. Na última pesquisa, em 2010, o último índice levantado pela pesquisa, alavancou para 56,72%. Ao comparar entre 1991 e 2000, o número alargou em 249,20%. Nos últimos 20 anos, subiu para 355,95%.

O quinto dado da pesquisa é quanto ao “subíndice de frequência escolar da população jovem”. No início da década de 1990, Votorantim estacionou no patamar de 0,357%. Na época, o município era considerado como “muito baixo” (abaixo de 0,499). Em 2000, o cenário mudou e foi para 0,684%, tornando-se do grupo “médio” (entre 0,600 e 0,699) de números de alunos regularmente no ensino da cidade. E há três anos, pulou para o patamar “alto” (entre 0,700 e 0,799), computando 0,807%.

Quanto ao “percentual da população de 18 anos ou mais com fundamental completo”, o município há 20 anos registrava 24,10% dos habitantes com até a 5ª série finalizada. No começo da década de 2000, saltou para 43,80%, um aumento entre um dado e outro de 81,74%. Em 2010, cresceu em 63,99% e, ao comparar com o ano de 1991, houve um aumento de 165,52%.

No penúltimo item de educação, que é o “subíndice de escolaridade fundamental da população adulta”, na década de 1990, Votorantim estava numa colocação considerada como muito baixa na pesquisa, com 0,241, sendo que a média é 0,6. 10 anos mais tarde, o município continuou no mesmo patamar. Na última pesquisa, a cidade entrou no índice médio – 0,640. Para alcançar nível alto, precisa-se chegar a 0,7. Entre o muito baixo e médio, cresceu-se 165,56%.

Por fim, o “índice de desenvolvimento humano municipal (dimensão educacional)”. Nas três pesquisas, Votorantim apresentou um quadro crescente: 0,313 (muito baixo), 0,438 (muito baixo) e 0,640 (médio), em 1991, 2000 e 2010, respectivamente. Ao comparar o primeiro dado com o último, o município aumentou em 138,66% e, nos últimos 10 anos, 26,61%.

Expectativa de vida

Em relação à expectativa de vida em Votorantim, o quadro apresentado pela pesquisa não cresceu ao comparar com os outros dados. Em 1991, por exemplo, 68,63% da população votorantinense representava perspectiva ao nascer. Já 10 anos mais tarde, o número aumentou em menos de 4%. E em 2010, foi para 75,30%. Ou seja, do primeiro ao último índice, Votorantim aumentou sua esperança de vida em 9,72%.

Referente ao índice de desenvolvimento humano municipal (dimensão longevidade), o município computou, em 1991, 0,727 - considerado como alto-, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Em 2000, o número praticamente ser manteve e chegou a 0,794. E há três anos, a cidade foi para 0,838 – saltando de alto para muito alto. Nos últimos 20 anos – transição de alto para muito alto -, cresceu em 15,27%.

Renda

A renda per capita (média) por habitante no município, no início da década de 1990, era de R$ 443,38. Passaram-se 10 anos e a renda subiu para R$ 605,92 - aumentou em relação a um período e outro de 36,66%. Em 2010, subiu para R$ 703,99 e, nos últimos 20 anos, aumentou em 58,78%. Ou seja, um pouco mais de um salário mínimo que, atualmente, é de R$ 678,00. Neste índice, a cidade está em 1068ª colocação. Como objeto de comparação, o município de São Caetano do Sul/SP, que está em primeiro no ranking, tem média de mais de R$ 2 mil.

Já o “índice de desenvolvimento humano municipal (dimensão renda) obteve, nas três pesquisas, índices de 0,645 (médio), 0,695 (médio) e 0,720 (alto) – 1991, 2000 e 2010, respectivamente. Nos últimos 20 anos, cresceu 7,75% e, nos últimos 10 anos, a 3,60%.

Prefeito de Votorantim veta três PLs a menos que antecessor

Em pouco mais de sete meses como prefeito de Votorantim, Erinaldo Alves da Silva (PSDB) vetou, até o momento, três projetos de lei (PL) a menos que no governo anterior, de Carlos Augusto Pivetta (PT). O primeiro veto do atual Chefe do Executivo foi em abril, a um projeto de autoria do presidente da Câmara, o vereador Heber de Almeida Martins (PDT). Além disso, o tucano revogou a doação de áreas públicas para empresas, de autoria de seu antecessor.

Com isso, Erinaldo vetou três PLs em pouco menos de quatro meses - média de 0,75 por mês. Se o balanço contar desde o início dos trabalhos na Câmara, em fevereiro, a média cai para 0,5 por mês. Até o momento, foram apresentados 41 projetos de lei ordinária.

O mais recente a ser vetado foi de autoria do vereador Marcos Antônio Alves (PT), o Marcão Papeleiro. Na última sessão legislativa, realizada na última segunda-feira (22), o petista ficou ciente de que seu projeto havia sido rejeitado pelo prefeito.

O PL de Marcão refere-se à implantação do Programa de Castração Móvel em Votorantim, destinado ao controle da população animal da cidade. O objetivo é desacelerar o crescimento de animais no município, pois há animais soltos pelas ruas, que adquirem doenças e passam frio e fome.

A justificativa do Executivo é que a lei do petista fere à competência privativa do Chefe do Executivo, sendo vedada a iniciativa parlamentar neste caso, pois a propositura interfere nas atribuições legais e funcionamento dos órgãos da administração direta. Ainda conforme o ofício em resposta a PL, ao obrigar o prefeito à execução de ato administrativo concreto, sem que tenha sido feita a prévia avaliação do impacto orçamentário financeiro, o projeto pode ser considerado inconstitucional, de acordo com a Lei Orgânica.

De acordo com a assessoria da Casa de Leis, o veto do prefeito será colocado em votação na próxima sessão.

Transporte coletivo
O primeiro PL (n° 016/13) não sancionado pelo prefeito foi assinado pelo presidente da Câmara. O texto, apresentado em junho, dispõe sobre desembarque nos transportes coletivos de pessoas com deficiência física ou visual, com dificuldade de locomoção, no perímetro urbano do município.

A justificativa de veto do prefeito foi com base nos artigos 82 e 57 da Lei Orgânica da cidade, por ser contrário ao interesse público, com fundamento no parecer técnico da Secretaria de Segurança Comunitária, Trânsito e Transporte, a qual não recomenda que o desembarque seja realizado em locais fora do ponto, uma vez que pode comprometer a segurança dos usuários, inclusive a pessoa com deficiência física ou visual.

De acordo com o ofício, na operação de desembarque os coletivos deverão posicionar-se próximos ao alinhamento do meio fio, o que não poderá ser realizado em qualquer espaço, pois os pontos de ônibus são dotados de infraestrutura para assegurar ao usuário do sistema de transporte o máximo de segurança, especialmente às pessoas com deficiência.

Denominação de via

O segundo não de Erinaldo foi para um parlamentar da mesma sigla. Trata-se de Bruno de Almeida Martins (PSDB). Em abril, o tucano apresentou o projeto de lei (n° 018/13) com a intenção de denominar as vias públicas (ruas 03, 04 e 06), da fase 4 do loteamento Real Parque, como rua Alessandro Moraes,  que é um cidadão emérito do município.

O prefeito vetou por ser contrário ao interesse público, uma vez que as ruas já possuem numeração oficial. Além disso, considera-se cada via como única, havendo, dessa forma, a necessidade de denominação individual para as ruas.

Doação de área pública

O quarto caso não é de caráter de veto e, sim, de retroceder a ordem que já foi sancionada, no caso do prefeito anterior. A revogação foi foi colocada em pauta na sessão legislativa em junho, para que todos os legisladores terem a ciência do porquê da anulação dos dois projetos de doação de área pública para empresas particulares, que foram aprovadas em dezembro de 2010.

Na época, Erinaldo justificou que o terreno está localizado em zona rural, conforme a legislação de zoneamento de uso e ocupação do solo, e, portanto, não pode ser considerado como zona industrial.

Entretanto, o presidente da Casa de Leis espera um desfecho quanto à destinação do terreno público, que fica no Jardim Tatiana. Ele está trabalhando em cima para mostrar ao prefeito a importância da doação, o que vai levar ao crescimento daquela região.

Vetos do ex-prefeito

Dos seis projetos de lei, Pivetta vetou dois textos de autoria da base da situação no ano passado (entre fevereiro e julho), que foram dos parlamentares: Lázaro Alberto de Almeida (PMDB), o Labrego, e Solange de Oliveira Pedroso (PMDB).

Em abril, o petista rejeitou o projeto (n°005/12), de Bruno Martins de Almeida (PSDB), por ser contrário ao interesse público, uma vez que a entidade que se pretende declarar de utilidade pública, segundo a avaliação da Secretaria de Negócios Jurídicos, não se encontra regularizada perante ao município.

No mês seguinte, a lei (n° 011/12), de Solange de Oliveira Pedroso (PMDB), também não foi colocada adiante. Segundo avaliação da Secretaria de Governo, o projeto apresentado por Solange é de iniciativa do Poder Executivo.

No mesmo mês, a vereadora Fabíola Alves da Silva Pedrico apresentou PL (n° 022/12), que não foi para frente. Na justificativa, com base nos artigos 82 e 57 da Lei Orgânica, por ser contrário ao interesse público, segundo avaliação da Companhia de Habitação Popular de Votorantim (Cohap).

Em julho, os projetos (n°041 e 042/12), de autoria de Fernando de Oliveira Souza (DEM), foram rejeitados. De acordo com a prefeitura, a via pública que é objeto de denominação do parlamentar ainda não foi liberada para construção, devendo aguardar conclusão das obras.
Ainda em julho, o legislador Lázaro Alberto de Almeida (PMDB), o Labrego, apresentou a lei (n° 045/12), que foi vetada por Pivetta. Conforme parecer da Secretaria de Governo, há decisões judiciais prós e contra a matéria em questão.

Requerimento rejeitado

Ainda na última sessão legislativa, aconteceu a primeira rejeição de requerimento. A propositura é do parlamentar Bruno Martins de Almeida (PSDB). Dos 11 vereadores que compõem o sistema legislativo do município, sete legisladores foram contra ao requerimento (n° 377/13), inclusive João Cau (PSC), que questiona a administração pública se, realmente, está em seus planos a construção de um novo estádio, no bairro Mirante dos Ovnis. Também pergunta ao prefeito se poderia incluir nas discussões do plano diretor a desativação do Estádio “Municipal Domenico Paolo Metidieri”, situado à avenida Newton Vieira Soares, região central do município. No lugar do estádio, que foi construído na década de 1920, elaborar um projeto visando à criação de um estacionamento. Os parlamentares favoráveis foram a base tucana, que é encabeçada pela vereadora Fabíola Alves da Silva Pedrico.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Apagar a história com um estacionamento

Na sessão legislativa da Câmara Municipal de Votorantim/SP, que foi realizada na última segunda-feira (22), aconteceu a primeira rejeição de requerimento. A propositura é do parlamentar Bruno Martins de Almeida (PSDB). Dos 11 vereadores que compõem o sistema legislativo do município, sete legisladores foram contra ao requerimento (n° 377/13), inclusive João Cau (PSC), que é da situação.

O requerimento questiona a administração pública se, realmente, está em seus planos a construção de um novo estádio, no bairro Mirante dos Ovnis. Também pergunta ao prefeito se poderia incluir nas discussões do plano diretor a desativação do Estádio Municipal "Domenico Paolo Metidieri”, situado à avenida Newton Vieira Soares, região central do município. No lugar do estádio, que foi construído na década de 1920, elaborar um projeto visando à criação de um estacionamento. Os parlamentares favoráveis foram a base tucana, que é encabeçada pela vereadora Fabíola Alves da Silva Pedrico.

Fico contente com a desaprovação desta propositura. Desativar o Estádio Municipal "Domenico Paolo Metidieri” (construir um estacionamento no local) é ferir com a história e a identidade de Votorantim. É jogar ao lixo uma história de 89 anos. No início do estádio, inaugurado em 1924, o Sport Club Savoia, um dos primeiros clubes de futebol do Brasil, jogava e treinava no campo. Outro fato marcante que está na essência de Votorantim que, na época, era distrito de Sorocaba. Só mais tarde, em 1963, o então distrito se tornaria um município.

Bruno, por favor, veja o vídeo a seguir. Mostra a inauguração do Estádio Municipal "Domenico Paolo Metidieri”. Veja, que emocionante e nostálgico: http://www.youtube.com/watch?v=gDdOgmhW32Q. Não podemos perder esta história.

domingo, 14 de julho de 2013

Benjamin Constant - Da Liberdade dos Antigos Comparada a dos Modernos



Da Liberdade dos Antigos Comparada a dos Modernos*

 

Benjamin Constant


Senhores,
Proponho-me submeter a vosso julgamento algumas distinções, ainda bastante novas, entre duas formas de liberdade, cujas diferenças até hoje não foram percebidas ou que, pelo menos, foram muito pouco observadas. Uma é a liberdade cujo exercício era tão caro aos povos antigos; a outra, aquela cujo uso é particularmente útil para as nações modernas. Esta análise será interessante, salvo engano, sob um duplo aspecto.
Primeiro, a confusão destas duas espécies de liberdade foi, entre nós, durante épocas por demais conhecidas de nossa revolução, a causa de muitos males. A França viu-se molestada por experiências inúteis cujos autores, irritados pelo pouco êxito que alcançaram, tentaram forçá-la a usufruir de um bem que ela não desejava e contestaram-lhe o bem que ela queria.
Em segundo lugar, levados por nossa feliz revolução (eu a chamo feliz, apesar de seus excessos; porque atento para seus resultados) a desfrutar os benefícios de um governo representativo, é interessante e útil saber por que este governo, o único sob o qual podemos hoje encontrar alguma liberdade e tranquilidade, foi inteiramente desconhecido para as nações livres da antiguidade.
Sei que pretendem-se descobrir marcas desse governo em alguns povos antigos, na república da Lacedemônia por exemplo, e em nossos ancestrais, os gauleses; mas é um engano.
O governo da Lacedemônia era uma aristocracia monacal, de modo nenhum um governo representativo. O poder dos reis era limitado, mas o era pelos Éforos e não por homens investidos de uma missão semelhante à que a eleição confere em nossos dias aos defensores de nossas liberdades. Sem dúvida, os Éforos, depois de terem sido instituídos pelos reis, foram nomeados pelo povo. Mas eram apenas cinco. Sua autoridade era religiosa tanto quanto política; participavam do próprio governo, quer dizer, do poder executivo; por isso, sua prerrogativa, como a de quase todos os magistrados populares nas antigas repúblicas, longe de ser simplesmente uma barreira contra a tirania, tornava-se, as vezes, ela própria uma tirania insuportável.
O regime dos gauleses, que se parecia bastante com aquele que um certo partido desejaria nos devolver, era ao mesmo tempo teocrático e guerreiro. Os padres gozavam de um poder sem limites. A classe militar, ou a nobreza, possuía privilégios insolentes e opressivos. O povo não tinha direitos nem garantias.
Em Roma, os tribunos tinham até certo ponto uma missão representativa. Eles eram os porta-vozes dos plebeus que a oligarquia, que é a mesma em todos os séculos, havia submetido, derrubando os reis, a uma escravidão duríssima. No entanto, o povo exercia diretamente uma grande parte dos direitos políticos. Ele se reunia para votar as leis, para julgar os patrícios acusados de delito: só havia, portanto, em Roma, fracos traços do sistema representativo.
Este sistema é uma descoberta dos modernos e vós vereis, Senhores, que a condição da espécie humana na antiguidade não permitia que uma instituição desta natureza ali se introduzisse ou instalasse. Os povos antigos não podiam nem sentir a necessidade nem apreciar as vantagens desse sistema. A organização social desses povos os levava a desejar uma liberdade bem diferente da que este sistema nos assegura.
É a demonstrar-vos esta verdade que a leitura desta noite será consagra­da.
Perguntai-vos primeiro, Senhores, o que em nossos dias um inglês, um francês, um habitante dos Estados Unidos da América entendem pela palavra liberdade.
É para cada um o direito de não se submeter senão às leis, de não poder ser preso, nem detido, nem condenado, nem maltratado de nenhuma maneira, pelo efeito da vontade arbitrária de um ou de vários indivíduos. É para cada um o direito de dizer sua opinião, de escolher seu trabalho e de exercê-lo; de dispor de sua propriedade, até de abusar dela; de ir e vir, sem necessitar de permissão e sem ter que prestar conta de seus motivos ou de seus passos. É para cada um o direito de reunir-se a outros indivíduos, seja para discutir sobre seus interesses, seja para professar o culto que ele e seus associados preferem, seja simplesmente para preencher seus dias e suas horas de maneira mais condizente com suas inclinações, com suas fantasias. Enfim, é o direito, para cada um, de influir sobre a administração do governo, seja pela nomeação de todos ou de certos funcionários, seja por representações, petições, reivindicações, às quais a autoridade é mais ou menos obrigada a levar em consideração. Comparai agora a esta a liberdade dos antigos.
Esta última consistia em exercer coletiva, mas diretamente, várias partes da soberania inteira, em deliberar na praça pública sobre a guerra e a paz, em concluir com os estrangeiros tratados de aliança, em votar as leis, em pronunciar julgamentos, em examinar as contas, os atos, a gestão dos magistrados; em fazê-los comparecer diante de todo um povo, em acusá-los de delitos, em condená-los ou em absolvê-los; mas, ao mesmo tempo que consistia nisso o que os antigos chamavam liberdade, eles admitiam, como compatível com ela, a submissão completa do indivíduo à autoridade do todo. Não encontrareis entre eles quase nenhum dos privilégios que vemos fazer parte da liberdade entre os modernos. Todas as ações privadas estão sujeitas a severa vigilância. Nada é concedido à independência individual, nem mesmo no que se refere à religião. A faculdade de escolher seu culto, faculdade que consideramos como um de nossos mais preciosos direitos, teria parecido um crime e um sacrilégio para os antigos. Nas coisas que nos parecem mais insignificantes, a autoridade do corpo social interpunha-se e restringia a vontade dos indivíduos. Em Esparta, Terpandro não pode acrescentar uma corda à sua lira sem ofender os Éfo­ros. Mesmo nas relações domésticas a autoridade intervinha. O jovem lacedemônio não pode livremente visitar sua jovem esposa. Em Roma, os censores vigiam até no interior das famílias. As leis regulamentavam os costumes e, co­mo tudo dependia dos costumes, não havia nada que as leis não regulamentas­sem.
Assim, entre os antigos, o indivíduo, quase sempre soberano nas questões públicas, é escravo em todos seus assuntos privados. Como cidadão, ele decide sobre a paz e a guerra; como particular, permanece limitado, observado, reprimido em todos seus movimentos; como porção do corpo coletivo, ele interroga, destituí, condena, despoja, exila, atinge mortalmente seus magistrados ou seus superiores; como sujeito ao corpo coletivo, ele pode, por sua vez, ser privado de sua posição, despojado de suas honrarias, banido, condenado, pela vontade arbitrária do todo ao qual pertence.
Entre os modernos, ao contrário, o indivíduo, independente na vida privada, mesmo nos Estados mais livres, só é soberano em aparência. Sua soberania é restrita, quase sempre interrompida; e, se, em épocas determinadas, mas raras, durante as quais ainda é cercado de precauções e impedimentos, ele exerce essa soberania, é sempre para abdicar a ela.
Devo aqui, Senhores, deter-me um instante para prevenir uma objeção que me poderia ser feita. Há na antiguidade uma república na qual a escravização da existência individual ao corpo coletivo não é tão completa como acabo de descrevê-la. Esta república é a mais célebre de todas; podeis deduzir que desejo falar de Atenas. Voltarei a este ponto mais tarde e, admitindo a verdade do fato, expor-vos-ei a causa. Veremos por que, de todos os Estados antigos, Atenas é o que mais se pareceu com os modernos. Em qualquer outro lugar a jurisdição social era ilimitada. Os antigos, como diz Condorcet  não tinham nenhuma noção dos direitos individuais. Os homens não eram, por as­sim dizer, mais que máquinas das quais a lei regulava as molas o dirigia as engrenagens. A mesma submissão caracterizava os belos séculos da república ro­mana; o indivíduo estava, de certa forma, perdido na nação, o cidadão, na cidade.
Vamos agora retornar à origem dessa diferença essencial entre os anti­gos e nós.
Todas as repúblicas antigas eram fechadas em limites estreitos. A mais populosa, a mais poderosa, a mais importante delas não era igual em extensão ao menor dos Estados modernos. Como consequência inevitável de sua pouca extensão, o espírito dessas repúblicas era belicoso; cada povo incomodava continuamente seus vizinhos ou era incomodado por eles. Impelidos assim pela necessidade uns contra os outros, esses povos combatiam-se ou ameaçavam­-se sem cessar. Os que não desejavam ser conquistadores não podiam depor ar­mas sob pena do serem conquistados. Todos compravam a segurança, a independência, a existência inteira ao preço da guerra. Ela era o interesse constante, a ocupação quase habitual dos Estados livres da antiguidade. Finalmente, e como resultado necessário dessa maneira de ser, todos os Estados tinham es­cravos. As profissões mecânicas e mesmo, em algumas nações, as profissões industriais eram confiadas a mãos acorrentadas.
O mundo moderno oferece-nos um espetáculo totalmente oposto. Os menores estados atualmente são incomparavelmente mais vastos que Esparta ou Roma durante cinco séculos. Mesmo a divisão da Europa em vários Estados e, graças ao progresso do saber, mais aparente do que real. Enquanto antigamente cada povo formava uma família isolada, inimiga nata das outras famílias, uma massa de homens existe agora sob diferentes nomes, sob diversos modos de organização social, mas essencialmente homogênea. Ela é suficiente­mente forte para não temer hordas bárbaras. É suficientemente esclarecida pa­ra não querer fazer a guerra. Sua tendência é a paz.
Essa diferença acarreta uma outra. A guerra é anterior ao comércio; pois a guerra e o comércio nada mais são do que dois meios diferentes de atingir o mesmo fim: o de possuir o que se deseja. O comércio não é mais que uma homenagem prestada à força do possuidor pelo aspirante à posse. É uma tentativa de obter por acordo aquilo que não se deseja mais conquistar pela violência. Um homem que fosse sempre o mais forte nunca teria a idéia do comércio. É a experiência - provando que a guerra, isto é, o emprego da força contra a força de outrem, o expõe a resistências e malogros diversos - que o leva a recorrer ao comércio, ou seja, a um meio mais brando e mais seguro de interessar o adversário em consentir no que convém à sua causa. A guerra é o impulso, o comércio é o cálculo. Mas, por isso mesmo, devo haver um momento em que o comércio substitui a guerra. Nós chegamos a esse momento.
Não quero dizer que não tenha havido povos comerciantes entre os antigos. Mas esses povos de certa maneira oram exceção à regra geral. As limitações do uma leitura não me permitem apontar-vos todos os obstáculos que se opunham então ao progresso do comércio; aliás vós os conheceis tanto quanto eu; falarei apenas do um deles. O desconhecimento da bússola obrigava os marinheiros da antiguidade a não perder de vista as costas; Atravessar as colunas de Hércules, ou seja, passar o estreito de Gibraltar, era considerado o mais ousado dos empreendimentos. Os fenícios e os cartagineses, os mais hábeis dos navegadores, só o ousaram muito mais tarde e seu exemplo permaneceu longo tempo sem ser imitado. Em Atenas, da qual talaremos mais tarde, o juro marítimo era aproximadamente de sessenta por cento; o juro habitual era apenas de doze por cento, tanto a idéia de navegação distante implicava em ideia de perigo.
Além disso, se pudesse entregar-me a uma digressão, que infelizmente seria longa demais, eu vos demonstraria, Senhores, pelo detalhe dos costumes, dos hábitos, do modo de traficar dos povos comerciantes da antiguidade com os outros povos, que esse comércio era, por assim dizer, impregnado do espírito da época, da atmosfera de guerra e de hostilidade que os cercava. O comércio era então um acidente feliz: é hoje a condição normal, o fim único, a tendência universal, a verdadeira vida das nações. Aliás, elas querem o descanso; com o descanso, a fartura; e, como fonte da fartura, a indústria. A guerra é cada dia um meio menos eficaz de realizar seus desejos. Suas chances não oferecem mais, nem aos indivíduos, nem às nações, benefícios que igualem os resultados do trabalho pacífico o dos negócios regulares. Para os antigos, uma guerra feliz acrescentava escravos, tributos, terras, à riqueza pública ou particular. Para os modernos, uma guerra feliz custa infalivelmente mais do que vale.
Enfim, graças ao comércio, à religião, aos progressos intelectuais e morais da espécie humana, não há mais escravos nas nações europeias. Homens livres devem exercer todas as profissões, atender a todas as necessidades da sociedade.
Pode-se prever facilmente, Senhores, o resultado necessário dessas diferenças.
Primeiro, a extensão de um país diminui muito a importância política que toca, distributivamente, a cada indivíduo. O republicano mais obscuro do Roma e de Esparta era uma autoridade. Não acontece o mesmo com o simples cidadão da Grã-Bretanha ou dos Estados Unidos. Sua influência pessoal é um elemento imperceptível da vontade social que imprime ao governo sua direção.
Em segundo lugar, a abolição da escravatura privou a população livre de todo o lazer que o trabalho dos escravos lhe permitia. Sem a população escrava de Atenas, vinte mil atenienses não teriam podido deliberar cada dia na praça pública.
Em terceiro lugar, o comércio não deixa, como a guerra, intervalos de inatividade na vida do homem. O exercício continuo dos direitos políticos, a discussão diária dos negócios de Estado, as discussões, os conciliábulos, todo o cortejo e movimento das facções, a agitação necessárias, recheio indispensável, se ouso empregar esta expressão na vida dos povos livres da antiguidade, que se teriam entediado, sem esse recurso, sob o peso de uma ociosidade dolo­rosa, acarretariam apenas perturbações e cansaço às nações modernas, onde cada indivíduo, ocupado por suas especulações, por seus empreendimentos, pelos resultados que obtém ou espera, quer ser desviado disso o menos possível.
Finalmente, o comércio inspira aos homens um forte amor pela independência individual. O comércio atende a suas necessidades, satisfaz seus desejos, sem a intervenção da autoridade. Esta intervenção é quase sempre, e não sei por que digo quase, esta intervenção é sempre incômoda. Todas as vezes que o poder coletivo quer intrometer-se nas especulações particulares, ele atrapalha os especuladores. Todas as vezes que os governos pretendem realizar negócios, eles o fazem menos bem e com menos vantagens do que nós.
Disse, Senhores, que vos falaria de Atenas, cujo exemplo poderia opor-­se a algumas de minhas assertivas, mas que, ao contrário, vai confirmar todas elas.
Atenas, como já reconheci, era a mais comerciante de todas as repúblicas gregas; assim sendo, concedia a seus cidadãos muito mais liberdade individual do que Roma ou Esparta. Se pudesse entrar em detalhes históricos, eu vos faria ver que o comércio tinha feito desaparecer, entre os atenienses, varias das diferenças que distinguem os povos antigos dos povos modernos. O espírito dos comerciantes de Atenas era semelhante ao dos comerciantes de nossos dias. Xenofonte nos diz que, durante a guerra do Peloponeso, eles tiravam seus capitais do continente da Ática e os enviavam para as ilhas do Arquipéla­go. O comércio havia criado entre eles a circulação. Encontramos em Isócrates sinais do uso das letras de câmbio. Observai, pois, quanto seus costumes pareciam-se com os nossos. Em suas relações com as mulheres, vereis (cito ainda Xenofonte) os esposos, satisfeitos quando a paz e uma amizade discreta reina entre o casal, fechar os olhos ao irresistível poder das paixões, perdoar a primeira fraqueza e esquecer a segunda. Em suas relações com os estrangeiros, vê-los-emos estender os privilégios a todo aquele que, transportando-se com a família para seu território, instala um trabalho ou uma fábrica; por fim, fica­remos impressionados com seu amor excessivo pela independência individual. Na Lacedemônia, diz um filósofo, os cidadãos acorrem quando um magistrado os chama; mas um ateniense não se conformaria que o considerassem de­pendente de um magistrado.
No entanto, como várias outras circunstâncias que determinavam o caráter das nações antigas existiam também em Atenas; como havia uma população escrava e como o território era muito limitado, encontramos ai vestígios da liberdade dos antigos. O povo faz as leis, examina a conduta dos magistrados, intima Péricles a prestar contas, condena generais à morte. Ao mesmo tempo, o ostracismo, ato legal e louvado por todos os legisladores da época, o ostracismo, que nos parece uma revoltante iniquidade, prova que o indivíduo era ainda subordinado à supremacia do corpo social em Atenas, mais do que em qualquer Estado social livre da Europa do nossos dias.
Conclui-se do que acabo de expor que não podemos mais desfrutar da liberdade dos antigos a qual se compunha da participação ativa e constante do poder coletivo. Nossa liberdade deve compor-se do exercício pacifico da independência privada. A participação que, na antiguidade, cada um tinha na soberania nacional não era, como em nossos dias, uma suposição abstrata. A vontade de cada um tinha uma influência real; o exercício dessa vontade era um prazer forte e repetido. Em consequência, os antigos estavam dispostos a fazer muitos sacrifícios pela conservação de seus direitos políticos e de sua parte na administração do Estado. Cada um, sentindo com orgulho o que valia seu voto, experimentava uma enorme compensação na consciência de sua importância social.
Essa compensação já não existe para nós. Perdido na multidão, o indivíduo quase nunca percebe a influência que exerce. Sua vontade não marca o conjunto; nada prova, a seus olhos, sua cooperação. O exercício dos direitos políticos somente nos proporciona pequena parte das satisfações que os antigos nela encontravam e, ao mesmo tempo, os progressos da civilização, a tendência comercial da época, a comunicação entre os povos multiplicaram e variaram ao infinito as formas de felicidade particular.
Concluí-se que devemos ser bem mais apegados que os antigos à nossa independência individual. Pois os antigos, quando sacrificavam essa independência aos direitos políticos, sacrificavam menos para obter mais; enquanto que, fazendo o mesmo sacrifício, nós daríamos mais para obter menos.
O objetivo dos antigos era a partilha do poder social entre todos os cidadãos de uma mesma pátria. Era isso o que eles denominavam liberdade. O objetivo dos modernos é a segurança dos privilégios privados; e eles chamam liberdade as garantias concedidas pelas instituições a esses privilégios.
Eu disse no inicio que, por não terem percebido essas diferenças, homens bem intencionados tinham causado grandes males durante nossa longa e tempestuosa revolução. De forma nenhuma desejo dirigir-lhes críticas demasiado severas: mesmo o erro deles era desculpável. Não se consegue ler as belas páginas da antiguidade, não se revivem as ações desses grandes homens sem experimentar uma emoção muito especial que nada do que é moderno nos faz sentir. Os velhos elementos de uma natureza, anterior à nossa por assim dizer, parecem despertar dentro de nós face a essas lembranças. É difícil não sentirmos nostalgia desses tempos em que as faculdades do homem desenvolviam-se numa direção traçada antecipadamente, mas em um destino tão amplo, tão forte pela sua própria força e com tanto sentimento de energia e de dignidade; e, quando nos carregamos a essas reminiscências, é impossível não desejarmos imitar o que invejamos.
Essa impressão era profunda, principalmente quando vivíamos sob governos abusivos que sem serem fortes, eram vexatórios, absurdos nos princípios, miseráveis na ação; governos que tinham por móvel e arbitrário por me­ta, o aviltamento da espécie humana e que, ainda hoje, certos homens ousam louvar como se pudéssemos jamais esquecer que fomos testemunhas e vítimas de sua obstinação, de sua impotência e de sua derrocada. O objetivo de nossos reformadores foi nobre e generoso. Quem de nós não sentiu o coração bater de esperança no começo da estrada que eles pensavam abrir? E ai daqueles que ainda hoje não sentem a necessidade de declarar que reconhecer alguns erros cometidos por nossos primeiros guias não significa denegrir sua memória, nem negar opiniões que os amigos da humanidade professaram de geração em geração!
Mas esses homens tinham ido buscar várias de suas teorias nas obras de dois filósofos, que eles próprios não tinham se dado conta das modificações transmitidas por dois mil anos às tendências do gênero humano. Examinarei, pois, o sistema do mais ilustre desses filósofos, J. J. Rousseau, e mostrarei que, transportando para os tempos modernos um volume de poder social, de soberania coletiva que pertencia a outros séculos, este gênio sublime, que era animado pelo amor mais puro à liberdade, forneceu, todavia, desastrosos pretextos a mais de um tipo de tirania. Evidentemente, salientando o que considero como um engano importante a revelar, serei ponderado em minha refutação e respeitoso em minha crítica. Evitarei, é claro, juntar-me aos detratores de um grande homem. Quando o acaso me faz aparentemente concordar com eles em um único ponto, desconfio de mim mesmo; e, para consolar-me de parecer, por um instante, de sua opinião, sobre uma única e parcial questão, preciso desautorizar e descolorir quanto posso a esses supostos auxiliares.
No entanto, o interesse pela verdade deve superar considerações que tornam tão poderosos o brilho de um talento prodigioso e a autoridade de uma imensa reputação. Aliás, não é a Rousseau, como veremos, que se deve principalmente atribuir o erro que vou combater: ele pertence muito mais a um, de seus sucessores, menos eloquente, mas não menos austero; e mil vezes mais exagerado. Este, o abade de Mably, pode ser considerado o representante do sistema que, conforme as máximas da liberdade antiga, quer que os cidadãos sejam completamente dominados para que a nação seja soberana, e que o indivíduo seja escravo para que o povo seja livre.
O abade de Mably, como Rousseau e como muitos outros, tinha, conforme os antigos, tomado a autoridade do corpo social pela liberdade e todos os meios pareciam-lhe bons para estender a ação dessa autoridade sobre a parte recalcitrante da existência humana, da qual ele deplorava a independência. A queixa que ele expressa em todas as suas obras é que a lei só possa atingir as ações. Ele teria desejado que ela atingisse os pensamentos, as impressões mais passageiras, que ela perseguisse o homem sem trégua e sem deixar-lhe nenhum refúgio onde pudesse escapar a seu poder. Mal percebia, em qualquer povo, uma medida vexatória, já pensava ter feito uma descoberta e a propunha como modelo; ele detestava a liberdade individual como se detesta um inimigo pessoal; e, quando encontrava na história uma nação que estivesse completamente privada dela, embora tampouco tivesse ela liberdade política alguma, não podia deixar de admirá-la. Extasiava-se com os egípcios porque, dizia ele, tudo era organizado entre eles pela lei, desde o repouso até as necessidades; tudo era submetido ao poder do legislador; todos os momentos do dia eram preenchidos por algum dever. Mesmo o amor estava sujeito a essa intervenção respeitada e era a lei que, alternadamente, abria e fechava o leito nupcial.
Esparta, que reunia formas republicanas à submissão dos indivíduos, despertava no espírito desse filósofo um entusiasmo mais forte ainda. Esse grande convento parecia o ideal da perfeita república. Tinha por Atenas um profundo desprezo e teria dito com prazer sobre essa nação, a primeira da Grécia, o que um fidalgo acadêmico dizia sobre a Academia francesa: "Que despotismo espantoso! Todo mundo faz aí o que quer". Devo acrescentar que esse fidalgo falava da Academia como ela era há trinta anos.
Montesquieu, dotado de espírito observador, porque tinha a cabeça menos ­ardente, não caiu inteiramente nos mesmos erros. Impressionou-se com as diferenças que referi, mas não distinguiu a verdadeira causa delas.
"Os políticos gregos, diz ele, que viviam sob o governo popular, não reconhecia outra força que não fosse a da virtude. Os de hoje só nos falam de manufaturas, de comércio, de finanças, de riquezas e até de luxo”.
Ele atribui essa diferença à república e à monarquia; é preciso atribuí-la ao espírito oposto dos tempos antigos e dos tempos modernos. cidadãos das repúblicas, vassalos das monarquias, todos querem privilégios e ninguém pode, no estado atual das sociedades, deixar de querer isso. O povo mais afeito à liberdade em nossos dias antes da emancipação da França, era também o povo mais afeito a todos os prazeres da vida; e queria sua liberdade principalmente porque via nela a garantia dos prazeres que venerava. Antigamente, onde havia liberdade, podia-se suportar as privações; agora, onde há privação, é preciso a escravidão para que alguém se resigne a ela. Seria mais fácil hoje fazer um povo de espartanos do que educar espartanos para a liberdade.
Os homens que foram levados pela onda dos acontecimentos a liderar nossa revolução estavam, em consequência da educação que haviam recebido, imbuídos das opiniões antiquadas e absurdas que os filósofos de que falei ha­viam posto em realce. A metafísica de Rousseau, no interior da qual apareciam de repente, como relâmpagos, verdades sublimes e passagens de uma eloqüência arrebatadora; a austeridade de Mably, sua intolerância, seu ódio a todas as paixões humanas, sua ânsia de escraviza-las todas, seus princípios exagerados sobre a competência da lei, a diferença entre o que ele recomendava e o que existia, a verve com que atacava as riquezas e até a propriedade - todas essas coisas deviam encantar homens exaltados por uma vitória recente e que conquistadores do poder legal, estavam desejosos de estender esse poder em todas as direções. Para eles era uma autoridade preciosa a desses dois escritores que, desinteressadamente e lançando anátema contra o despotismo dos homens, haviam posto em axioma o texto da lei. Quiseram, pois, exercer a forca pública, segundo tinham aprendido com seus guias, tal como fora exercida antigamente nos Estados livres. Acreditaram que tudo ainda devia ceder frente a vontade coletiva e que todas as restrições aos direitos individuais seriam largamente compensadas pela participação no poder social.
Sabeis, Senhores, o que resultou disso. Instituições livres, apoiadas no conhecimento do espírito do século, teriam conseguido subsistir. O edifício renovado dos antigos desmoronou, apesar de esforços e de muitos atos heróicos que merecem admiração. É que o poder social feria em todos os sentidos a independência individual sem, contudo, destruir-lhe a necessidade. A nação não pensava que uma parte ideal em uma soberania abstrata valesse os sacrifícios que lhe pediam. Em vão repetiam-lhe com Rousseau: as leis da liberdade São mil vezes mais austeras do que é duro o jugo dos tiranos. Ela não aceitava essas leis austeras e, em seu descontentamento, pensava às vezes que o jugo dos tiranos seria preferível. A experiência a desenganou. Ela viu que a arbitrariedade dos homens era pior ainda que as piores leis. Mas as leis também devem ter limites.
Se consegui, Senhores, fazer-vos aceitar a opinião que, em minha convicção, esses fatos produzem, reconhecereis comigo a verdade dos princípios seguintes:
A independência individual é a primeira das necessidades modernas. Consequentemente, não se deve nunca pedir seu sacrifício para estabelecer a liberdade política.
Concluí-se daí que nenhuma das numerosas instituições, tão aplaudidas, que, nas repúblicas antigas, impediam a liberdade individual é aceitável nos tempos modernos.
Provar essa verdade, Senhores, parece inútil num primeiro momento. Muitos governos de nosso tempo não parecem inclinados a imitar as repúblicas da antiguidade. No entanto, por menos gosto que tenham pelas instituições republicanas, há certos costumes republicanos pelos quais esses governos sentem certa afeição. E lamentável que sejam precisamente aqueles que permitem banir, exilar, privar. Lembro-me que em 1802 foi introduzido, numa lei sobre os tribunais especiais, um artigo que adotava na França o ostracismo grego, e só Deus sabe quantos eloquentes oradores falaram-nos da liberdade de Atenas e de todos os sacrifícios que os indivíduos deviam fazer para conservar essa liberdade a fim de que este artigo fosse aceito, o que, contudo, não aconteceu. Da mesma forma, em época bem mais recente, quando autoridades temerosas tentavam timidamente dirigir as eleições a seu modo, um jornal, que não é tachado, no entanto, de republicano, propôs restabelecer a censura romana para afastar os candidatos perigosos.
Creio, pois, não me empenhar em uma digressão inútil se, para apoiar minha afirmação, disser algumas palavras sobre essas instituições tão elogia­das.
O ostracismo de Atenas repousava na hipótese de que a sociedade tem toda a autoridade sobre seus membros. Nesta hipótese, ele podia justificar-se; e, num pequeno Estado, onde a influência de um indivíduo, pelo seu crédito, sua clientela, sua glória, balançava muitas vezes o poder da massa, o ostracismo podia ter aparência de utilidade. Mas, para nós, os indivíduos tem direitos que a sociedade deve respeitar e a influência individual, como já observei, está tão perdida numa quantidade de influências, iguais ou superiores, que toda a opressão, motivada na necessidade de diminuir essa influência, é inútil e, consequentemente, injusta. Ninguém tem o direito de exilar um cidadão se ele não for condenado por um tribunal regular, segundo lei formal que atribui a pena de exílio à ação da qual é culpado. Ninguém tem o direito de arrancar o cidadão de sua pátria, o proprietário de suas terras, o comerciante de seu negócio­ o esposo de sua esposa, o pai de seus filhos, o escritor de suas meditações intelectuais, o ancião de seus hábitos. Todo exílio político é um atenta­do político. Todo exílio, infligido por uma assembleia com base em pretensos motivos de segurança pública, é um crime dessa assembleia contra a própria segurança pública, que não existe senão no respeito às leis, na observância das regras e na manutenção das garantias.
A censura romana supunha, como o ostracismo, um poder ilimitado. Numa república em que todos os cidadãos, mantidos pela pobreza numa simplicidade extrema de costumes, não exerciam nenhuma profissão que desvias­se sua atenção dos negócios do Estado e eram, assim, constantemente espectadores e juízes do poder público, a censura podia, por um lado, ter mais influência e, por outro, a arbitrariedade dos censores era contida por uma espécie de vigilância moral exercida contra eles. Mas logo que a extensão da república, a complicação das relações sociais e os refinamentos da civilização tiraram dessa instituição o que lhe servia ao mesmo tempo de base e de limite a censura degenerou, mesmo em Roma. Não fora, pois, a censura que criara os bons costumes; era a simplicidade dos costumes que assegurava o poder e a eficácia da censura.
Na França, uma instituição tão arbitrária como a censura seria ao mesmo tempo ineficaz e intolerável. No estágio atual da sociedade, os costumes compõem-se de matizes tênues, vagos, imperceptíveis, que se desnaturariam de mil maneiras se tentássemos dar-lhes mais precisão. Somente a opinião pode atingi-los; só ela pode julgá-los porque são da mesma essência. Ela se sublevaria contra toda autoridade positiva que quisesse lhe dar mais rigor. Se o governo de um povo pretendesse, como os censores de Roma, desonrar um cidadão por uma decisão discriminatória, a nação inteira reclamaria contra essa sentença, não ratificando as determinações da autoridade.
O que acabo de dizer sobre a transplantação da censura para os tempos modernos aplica-se a muitos outros aspectos da organização social, sobre os quais citam-nos a antiguidade ainda com mais frequência e com muito mais ênfase: a educação, por exemplo. O que não dizem sobre a necessidade de permitir ao governo de apoderar-se das novas gerações para educá-las a seu modo, e em quantas citações eruditas não apoiam essa teoria? Os persas, os egípcios, e a Galia, e a Grécia, e a Itália vêm alternadamente figurar aos nossos olhos! Pois bem, Senhores, não somos nem persas, submissos a um déspota, nem egípcios, subjugados por sacerdotes, nem gauleses, que podem ser sacrificados por druidas, nem enfim gregos ou romanos, cuja participação na autoridade social consolava da servidão privada. Somos modernos que queremos desfrutar, cada qual, de nossos direitos; desenvolver nossas faculdades como bem en­tendermos, sem prejudicar a ninguém; vigiar o desenvolvimento dessas faculdades nas crianças que a natureza confia à nossa afeição, tão esclarecida quanto forte, não necessitando da autoridade a não ser para obter dela os meios gerais de instrução que pode reunir; como os viajantes aceitam dela os longos caminhos, sem serem dirigidos na estrada que desejam seguir. A religião também está exposta às lembranças do passado. Defensores da unidade de doutrina citam-nos as leis dos antigos contra os deuses estrangeiros e apóiam os direitos da igreja católica com o exemplo dos atenienses que sacrificaram Sócrates por ter abalado o politeísmo; e o de Augusto que desejava que se permanecesse fiel ao culto de seus ancestrais, o que fez com que, pouco tempo depois, se entregassem os primeiros cristãos às feras.
Devemos desconfiar, Senhores, dessa admiração por certas reminiscências antigas. Se vivemos nos tempos modernos, quero a liberdade que convêm aos tempos modernos; se vivemos sob monarquias, suplico humildemente a essas monarquias de não tornar emprestados às repúblicas antigas meios de oprimir-nos.
A liberdade individual, repito, é a verdadeira liberdade moderna. A liberdade política é a sua garantia e é, portanto, indispensável. Mas pedir aos povos de hoje para sacrificar, como os de antigamente, a totalidade de sua liberdade individual à liberdade política é o meio mais seguro de afastá-los da primeira, com a consequência de que, feito isso, a segunda não tardará a lhe ser arrebatada.
Vede, Senhores, que minhas observações não tendem absolutamente a diminuir a importância da liberdade política. Não extraio dos fatos que vos expus as consequências que certos homens deles extraem. Porque os antigos foram livres e porque não podemos mais ser livres como os antigos, eles concluem que estamos destinados a ser escravos. Gostariam de constituir o novo estágio social com um pequeno número de elementos que dizem ser os únicos apropriados à situação atual. Esses elementos são preconceito para atormentar os homens, egoísmo para corrompê-los, frivolidade para aturdi-los, prazeres grosseiros para degradá-los, despotismo para conduzi-los; e também conhecimentos positivos e ciências exatas para melhor servir ao despotismo. Seria estranho que esse fosse o resultado de quarenta séculos durante os quais o espírito humano conquistou tantos recursos murais e físicos; não posso admitir isso.
Retiro das diferenças que nos distinguem da antiguidade consequências bem opostas. Não é a segurança que é preciso enfraquecer, é a regalia que é preciso aumentar, Não é à liberdade política que desejo renunciar; é a liberdade civil que reclamo junto com outras formas de liberdade política. Os governos não têm hoje, como não tinham antigamente, o direito de atribuir-se um poder ilegítimo. Mas os governos que brotam de fonte legitima têm ainda me­nos do que os de antanho o direito de exercer sobre os indivíduos uma supremacia arbitraria. Possuímos ainda hoje os direitos que tivemos sempre, os direitos eternos de aceitar as leis, de deliberar sobre nossos interesses, de ser par­te integrante do corpo social do qual somos membros. Mas os governos têm novos deveres. Os progressos da civilização, as transformações operadas através dos séculos pedem a autoridade mais respeito pelos hábitos, pelos afetos, pela independência dos indivíduos. Ela deve dirigir esses assuntos com mão mais prudente e mais leve.
Essa contenção da autoridade, que se mantém em seus estritos deveres, atém-se também a seus interesses bem entendidos; pois se a liberdade que convém aos modernos é diferente da que convinha aos antigos, o despotismo que era possível entre estes não é mais possível entre os modernos. Do fato de que estamos muitas vezes mais descuidados com a liberdade política do que eles podiam estar, e, em nossa condição costumeira, menos apaixonados por ela, pode-se concluir que negligenciamos demais às vezes, e sempre sem motivos, as garantias que ela nos assegura; mas ao mesmo tempo, como buscamos mui­to mais a liberdade individual do que os antigos, nós a defenderemos, se for atacada, com muito mais ímpeto e persistência; e possuímos para a defesa meios que os antigos não possuíam.
O comércio torna a ação da arbitrariedade sobre nossa existência mais vexatória do que antigamente, porque, sendo nossas especulações mais varia­das, o arbítrio deve multiplicar-se para atingi-las; mas o comércio também torna a ação da arbitrariedade mais fácil de enganar, porque ele modifica a natureza da propriedade, que se torna, por esta modificação, quase inapreensível.
O comércio dá à propriedade uma qualidade nova: a circulação; sem circulação, a propriedade não é mais que usufruto; a autoridade pode sempre in­fluir no usufruto, pois pode impedir o gozo dele; mas a circulação põe um obstáculo invisível e invencível a essa ação do poder social;
Os efeitos do comércio estendem-se ainda mais longe; não somente ele emancipa os indivíduos, mas, criando o crédito, torna a autoridade dependente.
O dinheiro, diz um autor francês, é a arma mais perigosa do despotismo; mas é ao mesmo tempo seu freio mais poderoso; o crédito está submetido à opinião; a força é inútil, o dinheiro esconde-se ou foge; todas as operações do Estado ficam suspensas. O crédito não tinha a mesma influência entre os antigos; seus governos eram mais fortes que os particulares; em nossos dias estes são mais fortes que os poderes políticos; a riqueza é uma força mais disponível em todos os momentos, mais aplicável a todos os interesses e, em conseqüência, muito mais real e mais bem obedecida; o poder ameaça, a riqueza re­compensa; escapa-se ao poder enganando-o; para obter os favores da riqueza, é preciso servi-la.
Em conseqüência das mesmas causas, a existência individual é menos englobada na existência política. Os indivíduos transportam para longe seus tesouros; levam com eles todos os bens da vida privada; o comércio aproximou as nações e lhes deu hábitos e costumes mais ou menos semelhantes; os chefes podem ser inimigos; os povos são compatriotas.
Que o poder se resigne, pois, a isso; precisamos a liberdade e a tentemos; mas, como a liberdade que precisamos é diferente da dos antigos, essa liberdade necessita uma organização diferente da que poderia convir à liberdade antiga. Nesta, quanto mais tempo e forças o homem consagrava ao exercício de seus direitos políticos, mais ele se considerava livre; na espécie de liberdade a qual somos suscetíveis, quanto mais o exercício de nossos direitos políticos nos deixar tempo para nossos interesses privados, mais a liberdade nos será preciosa.
Daí vem, Senhores, a necessidade do sistema representativo. O sistema representativo não é mais que urna organização com a ajuda da qual uma nação confia a alguns indivíduos o que ela não pode ou não quer fazer. Os pobres fazem eles mesmos seus negócios; os homens ricos contratam administradores. E a história das nações antigas e das nações modernas. O sistema representativo é uma procuração dada a um certo número de homens pela mas­sa do povo que deseja ter seus interesses defendidos e não tem, no entanto, tempo para defendê-los sozinho. Mas, salvo se forem insensatos, os homens ricos que têm administradores examinam, com atenção e severidade, se esses administradores cumprem seu dever, se não são negligentes, corruptos ou in­capazes; e, para julgar a gestão de seus mandatários, os constituintes que são prudentes mantém-se a par dos negócios cuja administrado lhes confiam. Assim também os povos que, para desfrutar da liberdade que lhes é útil, decorrem ao sistema representativo, devem exercer uma vigilância ativa e constante sobre seus representantes e reservar-se o direito de, em momentos que não sejam demasiado distanciados, afastá-los, caso tenham traído suas promessas, assim ­como o de revogar os poderes dos quais eles tenham eventualmente abusa­do. Eis por que, tendo em vista que a liberdade moderna difere da antiga,
conclui-se que ela está ameaçada também por um perigo de espécie diferente.
O perigo da liberdade antiga estava em que, atentos unicamente à necessidade de garantir a participação no poder social, os homens não se preocupas­sem com os direitos e garantias individuais.
O perigo da liberdade moderna está em que, absorvidos pelo gozo da independência privada e na busca de interesses particulares, renunciemos demasiado facilmente a nosso direito de participar do poder político.
Os depositários da autoridade não deixam de exortar-nos a isso. Estão sempre dispostos a poupamos de toda espécie de cuidados, exceto os de obedecer e de pagar! Eles nos dirão; "Qual é, no fundo, o objetivo de todos os vossos esforços, o motivo de vosso trabalho, o objeto de vossas esperanças? Não é a felicidade? Pois bem, essa felicidade, aceitai e nós nos encarregaremos dela." Não, Senhores, não aceitemos. Por mais tocante que seja um interesse tão delicado, rogai à autoridade de permanecer em seus limites. Que ela se limite a ser justa; nós nos encarregaremos de ser felizes.
Poderíamos ser felizes através de regalias, se essas regalias fossem separadas das garantias? Ou encontraríamos essas garantias se renunciássemos à liberdade política? Renunciar a ela, Senhores, seria uma loucura semelhante a do homem que, sob pretexto de habitar no primeiro andar, pretendesse construir sobre a areia um edifício sem fundações.
De resto, Senhores, será mesmo verdade que a felicidade, de qualquer espécie que ela possa ser, seja o único objetivo do gênero humano? Nesse caso, nossa meta seria muito estreita e nosso destino muito pouco nobre. Não haveria nenhum de nós que - se quisesse rebaixar-se, restringir suas faculdades morais, aviltar seus desejos, renunciar à atividade, à glória, às emoções generosas   profundas - conseguisse embrutecer-se e ser feliz. Não, Senhores - e eu invoco como prova a parte melhor de nossa natureza, a nobre in­quietude que nos persegue e nos atormenta, a paixão em alargar nossas luzes e desenvolver nossas faculdades -, não é só à felicidade, é ao aperfeiçoamento que nosso destino nos chama; e a liberdade política é o mais poderoso, o mais enérgico modo de aperfeiçoamento que o céu nos concedeu.
A liberdade política, submetendo a todos os cidadãos, sem exceção, o exame e o estudo de seus interesses mais sagrados, engrandece o espírito, enobrece os pensamentos, estabelece entre eles uma espécie de igualdade intelectual que faz a glória e o poder de um povo.
Assim, vede como uma nação cresce com a primeira instituição que lhe devolve o exercício regular da liberdade política. Vede nossos cidadãos de to­das as classes, de todas as profissões, saindo do círculo de seus trabalhos habituais, de sua indústria privada, encontrar-se de repente do nível das funções importantes que a constituição lhes confia, escolher com discernimento, resistir com energia, confundir a astúcia, desafiar a ameaça, resistir nobremente à sedução. Vede o patriotismo puro, profundo e sincero triunfando em nossas cidades, animando até nossos povoados, atravessando nossas oficinas, reanimando nossos campos, impregnando do sentimento de nossos direitos e da necessidade de garantias o espírito justo e reto do agricultor útil e do negociante hábil, que, conhecedores através da história dos males que sofreram, e não menos esclarecidos sobre os remédios que esses males exigem, abrangem com o olhar a Franca inteira e, distribuidores do reconhecimento nacional, recompensam pelos votos, há trinta anos, a fidelidade aos princípios, na pessoa do mais ilustre dos defensores da liberdade.
Longe, pois, Senhores, de renunciar a alguma das duas espécies de liber­dade de que vos falei, é preciso aprender a combiná-las. As instituições, como diz o célebre autor da história das repúblicas na Idade Média, devem realizar os destinos do gênero humano; elas cumprem tanto mais esse objetivo quanto mais elevam o maior número possíveis de cidadãos à mais alta dignidade moral.
A obra do legislador não é completa quando apenas tornou o povo tranquilo. Mesmo quando esse povo está contente, ainda resta muita coisa a fazer. É preciso que as instituições terminem a educação moral dos cidadãos. Res­peitando seus direitos individuais, protegendo sua independência, não pertur­bando suas ocupações, devem, no entanto, consagrar a influência deles sobre a coisa pública, chamá-los a participar do exercício do poder, através de deci­sões e de votos, garantir-lhes o direito de controle e de vigilância pela manifes­tação de suas opiniões e, preparando-os desse modo, pela prática, para essas funções elevadas, dar-lhes ao mesmo tempo o desejo e a faculdade de executá-­las.

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* Revista Filosofia Política no. 2,  1985